quarta-feira, 22 de maio de 2013

RAPTO NA SERRA DE SÃO BENTO/RN - 1859

Algumas vezes, quando estou fazendo minhas pesquisas genealógicas, me deparo com uma notícia interessante publicada em jornal da época.
Hoje, lendo os exemplares do O Rio Grandense do Norte, me deparei com a seguinte notícia.
                                         Fonte: Hemeroteca digital 

Vale dizer que o fato ocorreu em fevereiro de 1859. Naquele tempo vigorava o Código Criminal do Império - promulgado em 1830, que definia como crime o rapto em seu art 227.
Era considerado crime o rapto de mulher virgem, ou reputada como tal , que fosse menor de dezessete anos da casa de seu pai, tutor ou curador, ou alguém que lhe tenha a guarda, para fins libidinosos, cuja pena era  de uma três anos de prisão. No entanto, se seguindo-se ao rapto ocorria o casamento não havia  nenhuma pena.
O fato inusitado, não é o rapto em si, e, em tese nem configuraria crime, já que a vítima era maior de 17 anos. Mas, a alegada violência por ter a moça saído da casa por uma parede de palha "de que era a mesma tapada" . 
Naquela época, na maioria das casas da região as paredes eram de palha, produto frágil por demais para impedir qualquer acesso às residências. No entanto, ainda assim era uma parede, o que para alguns significava o limite da propriedade configurando a violência no rapto.
Outros tempos, outros hábitos.
É bom lembrar que  o atual Código Penal de 1940, até 2005, dispunha  em seu art. 219 do CP: “Raptar mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude, para fim libidinoso: Pena — reclusão, 
de dois a quatro anos”.
O rapto violento ou mediante fraude (CP, art. 219) consistia na privação da liberdade da mulher honesta, mediante violência, grave ameaça ou fraude,  para fim libidinoso.
Em 1940, época em que predominava a tutela da liberdade sexual da mulher,  não se protegia a liberdade sexual de todas as mulheres, mas só das honestas, o que excluía as prostitutas, as depravadas, as libertinas.
Além de não resguardar a liberdade das mulheres consideradas "desonestas"  também não resguardava a liberdade sexual do homem, que podia ser raptado, mas não configurava o crime para a lei .
Atualmente, em face do princípio constitucional da dignidade da  pessoa humana e da igualdade, não há razão para tais discriminações.
A mulher - honesta ou não - ou homem estão tutelados pela lei, razão pela qual foi revogado o artigo, mas, de outro lado, acrescentado um inciso ao §1º do art. 148 do CP,  tornando qualificado o crime de sequestro ou cárcere privado com fins  libidinosos.
No Brasil de hoje quase não encontramos mais casas com paredes de palha. Não temos notícias de tantas moças raptadas por homens com o fim definido do casamento. Atualmente o tráfico de mulheres é a modalidade  de tráfico de pessoas mais praticada no mundo, que se presta única e exclusivamente à escravidão sexual.
No que pese os desacertos das novelas, a última, intitulada SÃO JORGE, da emissora GLOBO, tratou do tema, possibilitando a milhares de telespectadores reflexão sobre o assunto.
E, ao contrário da notícia do jornal de 1859, que não indica o número de escravas que eram abusadas sexualmente pelos seus senhores, seja em senzalas, seja em casas com paredes de palha, discorreu sobre o tema, dando relevância  ao respeito à dignidade humana.

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