sábado, 12 de julho de 2014

ALDEIA - SOLÂNEA/PB

ALDEIA
Em 1718, os índios sucurus solicitaram e obtiveram a concessão de terras, onde já habitavam há algum tempo, na "Serra da Boa Vista", no lugar do "olho d'água", para que "pudessem viver e plantar suas lavouras".
A população da aldeia naquela época era de aproximadamente 94 indivíduos, a maioria pertencente ao mesmo núcleo familiar composto de crianças e adolescentes.
Segundo consta o local onde se fixaram os sucurus, que vieram para a Paraíba justamente para combater os tapuias, cujos domínios se estendiam entre os rios Curimataú e o Araçagi, era muito fértil e abundante em água de boa qualidade - útil ao ser humano e para a criação de gados.
Uma vez concedidas as terras a aldeia rapidamente prosperou. E, como em todos os aldeamentos indígenas da época a presença de missionários se fez presente, embora não sendo certo o ano em que ali chegaram.
A única certeza que se tem, advinda de fontes históricas, é que alguns religiosos de Santa Tereza marcaram presença durante algum tempo e,  são deles a iniciativa da construção do primeiro oratório, por volta de 1730, cujo orago era Santo Antonio. Passando o lugar a ser denominado "Aldeia de Santo Antonio da Boa Vista".
Conforme comprova o registro abaixo, que é muito interessante pois comprova a presença na aldeia também de tapuias. 
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"Aos nove dias do mez de março de mil sete sentos trinta e douz annos na Capela da Boavista, administração dos sucurus e canindés, em licença minha batizou sem os santos oléos o Pe Manoel Jorge da Costa a Firmiano, filho natural de Antonia, tapuya, escrava do tenente Antonio Gomes de Macedo".
Com a fixação de uma grande cruz de madeira na área central da aldeia e algumas adaptações passaram a impor normas e costumes europeus na comunidade, tais como a proibição da nudez, construção de palhoças separadas para abrigar casais e sua prole, além da catequese.
A obrigatoriedade do batismo com nomes portugueses foi uma das práticas utilizadas que visava acabar com a identidade cultural dos membros da aldeia. Por outro lado, os religiosos proibiam também que os índios e seus descendentes fossem chamados de "caboclo", termo que consideravam pejorativo e ofensivo. Muito embora se saiba que foram assim denominados por muito tempo. Sendo que passou a ser apelido da família e até sobrenome.
Meu avô paterno LUIZ SEVERIANO DA COSTA, cuja pequena biografia tratei em outra postagem, era chamado por LUIZ CABOCLO, pois era da  "família CABOCLO". Muito embora até hoje ainda não consegui determinar com precisão sua ascendência indígena.   
O lugar onde foi fixada a cruz virou referência, sendo certo que até meados do século XIX podemos encontrar registros paroquiais onde o local era designado de "CRUZ DA ALDEIA".
Em relação ao "olho d'água" citado na concessão de terras, que se tratava de uma fonte ou nascente, ou seja, a água que surge por afloramento do lençol freático, podemos dizer que era incomum, já que seu volume era grande, bem diferente de outras nascentes do brejo paraibano.
Da mesma forma que a cruz virou referência, o olho d'água também, sendo certo que próximo a ele muitos passaram a residir, passando a ser denominado "OLHO D'ÁGUA DA ALDEIA".
Cabe ressaltar, que o município de SOLÂNEA\PB, além da ALDEIA, tem atualmente em sua zona rural, algumas localidades cujos nomes datam de pelo menos dois séculos, tais como: LAGES, BOM SUCESSO, LAGOA DE TANQUES, MATINHAS, JACARÉ, SALGADO e OLHO D'ÁGUA SECO.   
Outras como SANTA TEREZA e FAZENDA VELHA são reminiscências da antiga presença no local dos religiosos missionários de Santa Tereza na primeira metade do século XVIII. Desnecessário dizer que no período a quantidade de crianças batizadas com os prenomes ANTONIO e TEREZA também chama a atenção.  
O certo é que o OLHO D'ÁGUA DA ALDEIA era de grande importância naqueles tempos. Tanto é que não tardou que começaram os conflitos entre os índios aldeados e os fazendeiros fixados em terras ao redor. A água era vital e, em consequência, bem precioso.
Com o Diretório dos índios (a partir de 1758) e a política pombalina começam a surgir mudanças, entre as quais as transferências para outras aldeias. Daí ser uma consequência natural, que fosse também afetada a ALDEIA DE SANTO ANTONIO DA BOA VISTA.
Muitos índios já estavam completamente integrados na denominada sociedade local através de casamentos com o colonizador "português" e haviam pedido totalmente sua identidade cultural. Os poucos que restavam na aldeia que resistiram foram transferidos  e suas terras quase que imediatamente ocupadas. 
Até 1786, encontrei registros de batizados na capela da Boa Vista, como o que segue abaixo do batismo de DAMIÃO, em 24/04/1786, filho de Jozé Barreiro e sua mulher Angela Maria.  
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OU de IGNÊS, batizada em 29/05/1846, na Capela de Santo Antonio (registrada no livro de batismo de Bananeiras)
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É importante ressaltar que, bem próximo à Aldeia, um agrupamento humano surgiu, tornando-se próspero, já que era ponto de passagem do caminho que ligava o litoral ao sertão,  a "CHÃ DO MORENO". Aliás, é bom destacar que o referido caminho remontava a época pré-cabralina, muito utilizado pelos índios de várias etnias.  
Chã, Chan ou Xam era como chamavam antigamente uma terra plana na serra, razão pela qual a localidade tinha uma bela vista da aldeia, embrião do que é hoje a cidade de SOLÂNEA.             
Chã do Moreno prosperou, por outro lado a antiga ALDEIA, apesar de sua opulência, quase que completamente despareceu dos registro históricos. E, o pior crime que poderia se cometer ocorreu ao longo dos anos, simplesmente nenhum estudo sério foi feito no sentido de resgatar  sua importância histórica. Nenhuma investigação arqueológica. Nenhum rastreamento. Nenhum interesse... Nada. Uma lástima. E, assim tem sido em relação à cultura indígena, fadada ao esquecimento e degredo.
Felizmente, sobre o antigo olho d'água algumas pessoas deixaram registros, tais como Tancredo de Carvalho, que em Memórias de um Brejeiro (1975), narra a alegria que tinha na sua infância (por volta de 1909) de "descer" de Moreno para tomar banho na "fonte da Aldeia".  

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